sábado, 21 de janeiro de 2012

Que a vida é um sonho e que o sonho é a vida


Deitado na sua colcha vermelha, com os pés acima da cabeça, ele devorou todos os livros.
Os dois favoritos que se destacavam eram Alice no País das maravilhas e Alice no País do Espelho, de Lewis Carroll.
Ele amava a pura anarquia por trás de sua afetada fachada vitoriana, os trocadilhos e as trocas de letras, a lógica lunática, sempre enunciada em sintaxe impecável e escansão perfeita; as canções cujos refrões hipnoticamente simples (Will you, won’t you, Will you, won’t you, join the dance?/ “você vai, você não vai, você vai, você não vai, você vai entrar na dança?) Não precisavam ser acompanhados de música.

No fabuloso bestiário de Carroll, se ele tivesse sabido, havia várias encarnações suas- o hiperativo Chapeleiro Maluco, o sonolento Dormidongo; a Lagarta tragando satisfeita o seu narguilé, o Gato de Cheshire com seu riso zombombeteiro, a própria Alice, experimentando com pílulas e poções transformadoras da vida. A morsa, naquela praia de ostras e bebês para que se tornarem hors d’oeuvres. Mais influente de tudo foi o poema cômico-épico intitulado Jabberwocky/Pargarávio.

Para o menino com as pernas na parede nada menos do que uma lição sobre como o absurdo pode ser infinitamente mais descritivo do que o real.

O menino em questão era John Lennon.
Que nem imaginava, anos após, dar musicalidade aquelas loucuras todas de Carroll.



Alice no país do espelho termina com uma pequena poesia que diz:

Um barco navega, sonhando, contente,
Na tarde de julho - e o sol, complacente,
O mar ilumina em fulgor resplandente...

Crianças felizes, na praia abrigadas,
Num grupo de três, a escutar, encantadas,
Um simples relato de lendas douradas...

Desbotam memórias a cada arrebol
Dos ecos arcanos de antigo farol -
As geadas do inverno mataram o sol!...

O fantasma de Alice assombra-me ainda,
Debaixo dos céus se movendo  - tão linda!
Na terra invisível de sonhos infinda...

Somente crianças, ao ouvirem a história,
Com olhos ansiosos, atentas à glória,
Percebem o ouro no meio da escória...

E fazem seus ninhos na Terra Encantada,
Sonhando de dia e na noite estrelada
Com mortos verões transformados em nada...

E ao serem jogadas na estrada corrida
É a mensagem dourada afinal percebida:
Que a vida é um sonho e que o sonho é a vida!



A primeira parte dessa postagem faz alusão a biografia de John escrita por Philip Norman

3 comentários:

Flávio Antunes Soares disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Flávio Antunes Soares disse...

Li, atentamente, os textos deste blog. Gostei!
Tu sabes trabalhar bem as palavras.

Luciele Oliveira disse...

Obrigada! Bom saber que as palavras não são em vão!

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